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Regulamentação das Novas Regras de Preços de Transferência

A Receita Federal do Brasil publicou a Instrução Normativa nº 2.161/2023, estabelecendo regras para preços de transferência em transações controladas. As regras serão obrigatórias a partir de janeiro de 2024, com opção para 2023, e a análise de comparabilidade é central no novo sistema de preços de transferência. 

Após disponibilizar uma consulta pública para que os contribuintes pudessem encaminhar sugestões e comentários à minuta de instrução normativa sobre as novas regras de preços de transferência brasileiras introduzidas pela Lei n.º 14.596/2023, no dia 29 de setembro, a Receita Federal do Brasil (RFB) publicou o texto final da Instrução Normativa (IN) n.º 2.161/2023.  

De forma geral, a IN 2.161 manteve a maioria das disposições gerais da minuta inicialmente apresentada para fins da consulta pública.  

Assim, a referida IN não disciplinou a parte especial da Lei 14.596 que trata de transações específicas relativas a intangíveis, serviços intragrupo, compartilhamento de custos, reestruturação de negócios e operações financeiras. Também não foram regulados os dispositivos relativos aos processos de consulta específicos em matéria de preços de transferência a fim de conceder maior segurança jurídica aos contribuintes. 

Foram mantidas como fontes subsidiárias à interpretação das normas de preços de transferência, as diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). No entanto, o § 4º do art. 1º da IN 2.161 passou a condicionar tal uso à expressa aprovação pela RFB, o que poderá traduzir uma limitação prática à aplicação destas diretrizes, uma vez que sujeitas à edição futura de regulamentações específicas.  

Conforme originalmente previsto, as novas regras de preços de transferência serão obrigatórias a partir de janeiro de 2024 e opcionais para o ano de 2023. A nova redação posterga o prazo final para formalização de tal opção para o período de 1º de setembro a 31 de dezembro de 2023.  

Ainda assim, alterações relevantes podem ser verificadas na redação final da IN 2.161, conforme apontaremos de forma consolidada com os temas propostos originalmente na minuta submetida à consulta pública.  

Princípio arm’s length, Transações Controladas, Partes Relacionadas 

Em linha com a Lei 14.596, a versão final do artigo 2º da IN 2.161 mantém a aplicação das regras de preços de transferência para determinação da base de cálculo de IRPJ e CSLL em transações controladas efetuadas por pessoa jurídica domiciliadas no Brasil, filiais ou unidades de negócios, ainda que não sejam regulamente constituídas como pessoas jurídicas no Brasil, com partes relacionadas no exterior.  

As regras de preços de transferência serão aplicadas em observância ao princípio arm's length. Segundo esse princípio, os termos e as condições de uma transação controlada serão estabelecidos de acordo com aqueles que seriam estabelecidos entre partes não relacionadas em transações comparáveis. 

A IN 2.161 mantém a definição abrangente de transação controlada como qualquer relação comercial ou financeira entre duas ou mais partes relacionadas, estabelecida ou realizada de forma direta, ou indireta, incluídos contratos ou arranjos sob qualquer forma e série de transações.  

De modo a esclarecer o que seriam transações controladas indiretas, a IN 2.161 traz, em seu Anexo I, exemplos de operações indiretas que estariam sujeitas às novas regras de preços de transferência, cobrindo, operações em que terceiros figurem em estruturas mais complexas e indiretas.  

Também estão incluídas dentre as possibilidades operações controladas aquelas que envolvam a devolução ou subscrição de capital, dentre outras.  

Ainda, a IN 2.161 reflete o conceito amplo de partes relacionadas, traduzido pela influência direta ou indireta de uma das partes na outra, de modo a alterar o preço praticado nas transações. O § 4º do artigo 4º da IN 2.161 dá, inclusive, poderes ao fisco demonstrar a existência de influência, além das situações previstas pela Lei 14.596. 

Como novidade, a IN 2.161 incluiu previsão que define como partes relacionadas as entidades situadas no mesmo país, inclusive no Brasil, mesmo nas situações em que as transações entre elas não estejam sujeitas ao controle de preços de transferência.  

Análise de Comparabilidade e aplicação do princípio arm’s length 

A análise de comparabilidade é o pilar do novo sistema de preços de transferência, realizada a partir das principais características das transações.  

Uma transação entre partes não relacionadas será considerada comparável à transação controlada quando (i) não houver diferenças que afetem materialmente os indicadores relevantes na aplicação do método mais apropriado ou (ii) puderem ser efetuados ajustes razoavelmente precisos para eliminar os efeitos materiais das diferenças. 

Para determinar se os termos e as condições estabelecidos na transação controlada estão de acordo com o princípio arm’s length, devem ser efetuadas duas etapas de verificação: (i) o delineamento da transação controlada; e (ii) a análise de comparabilidade da transação controlada delineada. 

O delineamento da transação controlada será efetuado com fundamento nos fatos e circunstâncias da transação, evidenciado pela conduta efetiva das partes que identifiquem as efetivas relações comerciais/financeiras, bem como as características economicamente relevantes associadas a essas relações.  

Neste sentido, no delineamento da transação controlada serão ponderados fatores como o setor econômico, a estrutura do grupo multinacional, funções, ativos e riscos, além da cadeia de suprimentos e sua agregação de valor para cada entidade do grupo.  

Ainda, a IN 2.161 inaugura espécie de presunção relativa de inobservância ao princípio arm’s length, na hipótese de a entidade brasileira acumular prejuízos recorrentes quando o restante do grupo econômico se mostre lucrativo.  

A IN 2.161 define os fatores de comparabilidade (características economicamente relevantes) a serem considerados para o delineamento da transação controlada, bem com detalha a aplicação de cada um deles:  

  • os termos contratuais da transação, que derivam tanto dos documentos e dos contratos formalizados como das evidências da conduta efetiva das partes. Neste ponto, a redação final da IN 2.161 estabelece que uma relação comercial ou financeira deve ser delineada ainda que não esteja formalizada em documentos; 
  • as funções desempenhadas pelas partes da transação, considerados os ativos utilizados e os riscos economicamente significativos assumidos.  
  • as características específicas dos bens, direitos ou serviços objetos da transação controlada. Neste particular, inova a IN 2.161 ao determinar que a transferência de um bem tangível com um intangível integrado não será considerada, em geral, como transferência desse intangível se o adquirente não detiver direitos de exploração específicos do intangível. Também, a regulamentação estabelece que o valor do bem tangível poderá ser influenciado pelo intangível a ele associado, o que abre margem para possíveis dificuldades na avaliação dos bens negociados;  
  • as circunstâncias econômicas das partes e do mercado em que operam; 
  • as estratégias de negócios, inclusive aquelas de caráter excepcional e temporárias; e 
  • outras características consideradas economicamente relevantes. 

De acordo com a IN 2.161, uma transação controlada pode não ser reconhecida conforme delineada pelo contribuinte. Em outras palavras, a transação pode ser desconsiderada ou substituída caso se verifique que uma parte não relacionada, ao negociar um contrato ou continuar um negócio em andamento teria optado por uma alternativa realisticamente disponível e comercialmente racional que seja claramente mais vantajosa (ainda que tal alternativa represente a denúncia ou renegociação). A “racionalidade comercial” não pode ser justificada com base na carga tributária ou qualquer outro interesse não comercial. Também, apenas um termo ou condição específica da transação delineada poderá ser desconsiderada, devendo ser substituída por outra, no limite necessário para refletir a racionalidade comercial buscada.  

Sobre a análise de comparabilidade, a IN 2.161 esclarece que esta buscará confrontar os termos e condições da transação controlada com aqueles estabelecidos com partes não relacionadas, tomando como critério os elementos caracterizadores, tais quais as características das operações, as datas das celebrações, disponibilidade de informações, a seleção do método mais apropriado, incertezas na precificação, existência de sinergia, dentre outros.  

Segundo a IN 2.161, as informações de transações podem ser obtidas por meio de comparáveis internos (transações realizadas entre partes não relacionadas em que uma das partes é também parte da transação controlada) ou comparáveis externos (transações realizadas entre partes não relacionadas em que nenhuma das partes é parte da transação controlada). Nesse sentido, cabe dizer que parágrafo único do art. 22 exclui expressamente o uso, como comparáveis, de transações realizadas entre partes relacionadas (ainda que situadas no Brasil ou uma delas seja pessoa física). Adicionalmente, não são considerados comparáveis confiáveis as transações que não tenham sido realizadas no curso normal de negócios; ou transações realizadas como propósito de estabelecer uma transação comparável à transação controlada. 

A análise de comparabilidade inclui as seguintes etapas:  

  • Determinação do período abrangido na análise; 
  • Verificação de comparáveis internos;  
  • Identificação de comparáveis externos (quando necessário);  
  • Seleção do método mais apropriado, e dependendo do método, a escolha do indicador de rentabilidade e parte testada;  
  • A identificação de potenciais comparáveis, incluindo a determinação das características essenciais que devem estar presentes em qualquer transação entre partes não relacionadas para que possa ser considerada potencialmente comparável, tendo em vista o delineamento da transação controlada e os fatores de comparabilidade; 
  • A identificação e a realização de ajustes de comparabilidade razoavelmente precisos quando apropriado; e 
  • a interpretação e o uso dos dados coletados com a determinação da remuneração adequada em conformidade com o princípio arm's length. 

Para fins de aplicação da análise de comparabilidade, a IN 2.161 determina preferencialmente a aplicação de comparáveis domésticos (identificados no mercado geográfico onde a parte testada opera), sendo a aplicação de comparáveis não domésticos (identificados em outros mercados geográficos) possível apenas na ausência de informações disponíveis ou confiáveis.  

Ressaltamos que a aplicação de comparáveis domésticos pode dificultar a aplicação das novas regras, uma vez que será necessário adquirir informações locais para fins de análise de comparabilidade.  

Conforme artigo 25 da IN 2.161, o princípio arm’s length deverá ser aplicado a cada transação separadamente. Neste ponto, existe incerteza se a aplicação das novas regras deverá ser feita produto a produto, ou se será possível agrupar produtos considerados comparáveis para fins de análise de observância do princípio arm’s length.   

O artigo 26 permite o uso de dados não transacionais – assim entendidos aqueles agregados de um conjunto de transações que não possam ser identificados – de partes não relacionadas, para fins da aplicação do método da Margem Líquida da Transação (“MLT”). Contudo, a confiabilidade destes dados estará condicionada à consonância com as transações testadas.   

Foi mantida a permissão para realização de compensações intencionais, quando uma parte relacionada poderá compensar o benefício fornecido a outra parte relacionada em uma transação controlada por meio de um benefício recebido da outra parte relacionada em transação controlada diversa, desde que a compensação seja estabelecida em condições arm’s length.  

De qualquer forma, as transações que derem origem às compensações devem ser consideradas, delineadas e documentadas de forma individualizada, em seu montante integral, e o ganho ou a perda líquida do contribuinte deverá ser computado na determinação da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. A possibilidade de compensação, não afasta o cumprimento dos requisitos de registro das transações segundo as normas contábeis e a observância das normas relativas aos demais tributos. 

Foi retirada a previsão de que as informações de transações realizadas entre partes não relacionadas utilizadas para fins da análise de comparabilidade deveriam referir-se a mesma data na qual a transação controlada foi celebrada. Nesse sentido, conforme artigo 28 da IN 2.161, os termos e as condições da transação controlada que seriam estabelecidos por partes não relacionadas devem ser verificados quando a transação controlada é celebrada, considerando-se as opções realisticamente disponíveis.  

Desta forma, assim como determina o artigo 29 da IN 2.161, as informações de transações entre partes não relacionadas, para fins de análise de comparabilidade, deverão ser contemporâneas à celebração da transação controlada, com vistas a obter informação com maior grau de comparabilidade e confiabilidade. Não sendo possível, deverão ser utilizadas informações de transações comparáveis não contemporâneas que revelem o maior grau de comparabilidade considerando as circunstâncias econômicas das transações e efetuados os eventuais ajustes necessários.  

Os benefícios ou prejuízos obtidos em decorrência dos efeitos de sinergia de grupo, serão alocados entre as partes da transação controlada na proporção de suas contribuições para a criação do efeito de sinergia e ficarão sujeitos a compensação. Tais efeitos, conforme esclarecido na versão final da IN, inclusive no caso de benefícios incidentais não sujeitos à compensação, deverão ser levados em consideração na análise de comparabilidade. 

A IN manteve a permissão para o uso de dados de múltiplos anos sobre transações comparáveis quando aumentar a confiabilidade da análise de comparabilidade e esclareceu nas hipóteses em que sejam utilizados para formação do intervalo de comparáveis deverá ser calculada a média aritmética dos indicadores financeiros aplicáveis em cada método, conforme definido pela IN. 

O artigo 32 da IN 2.161 disciplina os ajustes de comparabilidade para eliminar efeitos materiais das diferenças em relação à transação controlada ou à parte testada, trazendo exemplos de ajustes de comparabilidade. Os ajustes somente serão aplicáveis se aumentarem a confiabilidade dos resultados e o grau de comparabilidade.  

Métodos de Preço de Transferência 

Em que pese o fato de restarem ainda muitas dúvidas acerca da aplicação dos métodos de preços de transferência, a IN 2.161 apresentou maiores detalhamentos sobre a forma de aplicação dos 5 principais métodos introduzidos pela Lei 14.596.  

Ao contrário da antiga permissão de eleição do método mais favorável ao contribuinte, o Art. 34 explicita que o método mais apropriado será aquele que demonstre, de maneira mais confiável, as condições de uma transação celebrada entre partes não relacionadas.  

Não obstante, o método PIC será considerado o mais apropriado quando houver informações confiáveis de preços ou valores de contraprestações decorrentes de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas, a menos que se possa estabelecer que outro método seja aplicável de forma mais apropriada.  

Poderá ser possível a utilização de uma combinação de métodos quando os aspectos da transação revelarem ser inconclusiva a utilização de um único método. 

Feitas essas considerações, sumarizamos a seguir as características mais relevantes dos métodos: 

Preço Independente Comparável (PIC): comparação do preço ou o valor da contraprestação da transação controlada com os preços ou os valores das contraprestações de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas.  

Esclareceu-se que a confiabilidade do método PIC está condicionada a uma similaridade significativa entre as características economicamente relevantes da transação comparável e as da transação controlada. 

Para fins de aplicação do PIC, deve-se levar em conta fatores como (i) características dos bens e serviços, e sua qualidade; (ii) termos contratuais, incluindo termos de entrega e volume negociado e condições de amortização ou liquidação antecipada de dívida e opções contratuais; (iii) o nível do mercado (varejo ou atacado); (iv) data e a hora das transações, em especial no caso de commodities; e (v) diferenças de preço nos mercados geográficos. Além disso, devem ser considerados os efeitos sobre o preço de funções desempenhadas e não apenas a comparabilidade das características dos bens e serviços.  

Cumpridos os requisitos de comparabilidade e similaridade, presume-se que o PIC e seria o método mais adequado a ser adotado pelos contribuintes, inclusive para fins de transações com commodities (eliminando os antigos métodos PCI e PCEX).  

Note que, conforme artigo 37 da IN 2.161, nas hipóteses em que o método PIC for aplicado com base no preço de cotação, o valor da commodity será determinado com base na data ou no período de datas acordado pelas partes para precificar a transação quando:  

- o contribuinte fornece documentação tempestiva e confiável que comprove a data ou o período de datas acordado pelas partes da transação, incluídas as informações sobre a determinação da data ou do período de datas utilizado pelas partes relacionadas nas transações efetuadas com os clientes finais, partes não relacionadas, e efetuar o registro da transação; e  

- a data ou o período de datas especificado na documentação apresentada for consistente com a conduta efetiva das partes e com os fatos e as circunstâncias do caso. 

Considera-se cliente final o primeiro adquirente que seja uma parte não relacionada e desde que não haja outro adquirente que seja uma parte relacionada em uma etapa subsequente 

Caso os itens acima não sejam observados, a autoridade fiscal poderá determinar o valor da commodity com base no preço de cotação referente (i) à data ou ao período de datas que seja consistente com os fatos e as circunstâncias do caso e com o que seria estabelecido entre partes não relacionadas em circunstâncias comparáveis; ou (ii) à média do preço de cotação da data do embarque ou do registro da declaração de importação, quando não for possível aplicar o disposto no item (i). 

Conforme artigo 64 da IN 2.161, o contribuinte deverá registrar a data ou do período de datas acordado pelas partes para precificar a transação em sistema disponível no e-CAC da RFB até o décimo dia subsequente ao subsequente ao decêndio em que ocorreu a transação.  

Enquanto o sistema para registro das informações do artigo 64 da IN 2.161 não for instituído pela RFB, o contribuinte não será obrigado a fornecer a documentação referente ao registro da transação como condição para determinação do valor da commodity com base na data ou no período de datas acordado pelas partes para precificar a transação 

Preço de Revenda menos Lucro (PRL): que consiste em comparar a margem bruta que um adquirente de uma transação controlada obtém na revenda subsequente realizada para partes não relacionadas com as margens brutas obtidas em transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas. Houve extinção das margens fixas para cálculo dos preços de transferência.  

A margem bruta referida será definida como a razão entre o lucro bruto e a receita líquida da revenda associada à transação, representando o montante que uma parte não relacionada demandaria para cobrir as despesas operacionais relativas àquela transação e que, considerando funções desempenhadas, ativos utilizados e riscos assumidos, proporcione o lucro operacional que seria estabelecido entre partes não relacionadas em uma transação comparável.   

O método PRL é recomendado para transações que envolvam comercialização em geral e a sua confiabilidade diminuirá à medida em que o revendedor agregar valor ao objeto da revenda por meio do desempenho de funções adicionais, incluindo o processamento, ou quando houver ocorrido participação do revendedor no desenvolvimento, manutenção ou utilização de intangíveis associados ao produto que sejam detidos por uma parte relacionada. 

Ainda, restou explicitado que as atividades de embalagem, rotulação e pequenas montagens não constituem agregação de valor que necessariamente impeça a utilização do método PRL. 

Custo mais Lucro (MCL) - antigos CAP e CPL: que consiste em comparar a margem de lucro bruto obtida sobre os custos do fornecedor em uma transação controlada com as margens de lucro bruto obtidas sobre os custos em transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas.  

A margem de lucro bruto será definida como a razão entre o lucro bruto e a soma dos custos diretos e indiretos associados à transação, representando o montante que uma parte não relacionada demandaria para cobrir as despesas operacionais relativas àquela transação e que, considerando funções desempenhadas, ativos utilizados e riscos assumidos, proporcione o lucro operacional que seria estabelecido entre partes não relacionadas em uma transação comparável. 

Conforme artigo 40 § 2º da IN 2.161, o MCL seria o método mais apropriado para transações controladas que consistam em fornecimento de produtos semiacabados ou prestação de serviços.   

Margem Líquida da Transação (MLT): internalização do Transactional Net Margin Method (TNMM), método já reconhecido pela OCDE, que consiste em comparar a margem líquida da transação controlada com as margens líquidas de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas, ambas calculadas com base em indicador de rentabilidade apropriado. 

Para fins do MLT, a margem líquida é a razão entre o lucro operacional da transação controlada e um denominador que reflita um indicador de rentabilidade apropriado. 

Ainda, conforme determina o art. 42, a seleção do indicador de rentabilidade deverá se basear nos critérios de grau de comparabilidade, circunstâncias da transação controlada e disponibilidade de informações confiáveis de modo a melhor refletir os termos e condições negociadas entre partes não relacionadas.  

Método de Divisão do Lucro (MDL): outro método já reconhecido pela OCDE para fins de preços de transferência (Profit Split Method (PSM)) e que foi internalizado pelas novas regra. Consiste na divisão dos lucros ou das perdas, ou de parte deles, em uma transação controlada de acordo com o que seria estabelecido entre partes não relacionadas em uma transação comparável, consideradas as contribuições relevantes fornecidas na forma de funções desempenhadas, ativos utilizados e riscos assumidos pelas partes envolvidas na transação. 

O método MDL é apropriado para casos em que (i) cada uma das partes da transação controlada efetuar contribuições únicas e valiosas (contribuições não comparáveis a contribuições feitas por partes não relacionadas em circunstâncias compráveis e representem uma fonte essencial para gestão de benefícios econômicos reais ou potenciais nas operações), especialmente intangíveis, para a transação controlada; (ii) houver operações altamente integradas (operações em que a avaliação isolada do desempenho de funções, utilização de ativos e assunção de riscos de cada uma das partes da transação controlada não possa ser realizada de forma confiável); ou (iii) as partes compartilharem a assunção de riscos economicamente significativos ou separadamente assumirem riscos estreitamente interrelacionados. 

Além dos métodos acima, é possível a adoção de outros métodos, desde que os anteriores não sejam aplicáveis ou não produzam resultados confiáveis. A metodologia alternativa adotada deve produzir resultado consistente com aquele que seria alcançado em transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas. 

O artigo 46 da IN 2.161 estabelece que a utilização dos métodos PRL, MCL, MLT e MDL requer a seleção de uma das partes da transação controlada como parte testada, podendo a parte testada da transação controlada estar no Brasil ou no exterior. O contribuinte deverá fornecer as informações necessárias para a determinação correta das funções desempenhadas, dos riscos assumidos e dos ativos utilizados pelas partes da transação controlada, de modo a demonstrar a seleção apropriada da parte testada, e documentará as razões e as justificativas para a seleção efetuada.  

A IN 2.161 também esclarece que, quando a aplicação do método mais apropriado conduzir a um intervalo de observações de indicadores financeiros deverá se utilizar intervalo apropriado para determinar se os termos e transações cumprem o princípio do arm’s length. Tal determinação deverá observar os critérios de comparabilidade de modo que o uso de intervalo interquartil somente será apropriado quando a aplicação do método mais apropriado não permita a identificação de comparável com o mais alto grau de confiabilidade em relação à transação controlada.  

Ajustes de Preço de Transferência 

Ajuste espontâneo: realizado individualmente pelo próprio contribuinte, diretamente na apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, a fim de adicionar o resultado que seria obtido caso os termos e as condições da transação controlada tivessem sido estabelecidos conforme o princípio arm’s length

Ajuste compensatório: realizado entre as partes da transação controlada antes do encerramento do ano-calendário, a fim de ajustar o valor da transação de acordo com o princípio arm’s length.  

Conforme artigo 50 da IN 2.161, o ajuste compensatório deverá (i) ser efetuado na escrituração contábil da pessoa jurídica brasileira e das demais partes envolvidas na transação controlada (ii) ser devidamente comprovado por meio de emissão de notas de débito, crédito ou de documentação fiscal e comercial apta a comprovar a natureza e o montante do ajuste e (iii) ser ratificado por declaração dos representantes legais das partes evolvidas, da qual conste que efetuou o ajuste no mesmo valor daquele realizado pela pessoa jurídica brasileira. 

Ficou esclarecido que o ajuste compensatório poderá ser efetuado até a entrega da Escrituração Contábil Fiscal (ECF), desde que o registro contábil ocorra na contabilidade do ano-calendário relativo ao período de apuração a que se refere a transação controlada. Ainda, caso seja realizado mais de um ajuste compensatório para transações no mesmo ano-calendário envolvendo uma mesma parte, o contribuinte poderá obter uma única declaração do representante legal da parte controlada.  

Também, a IN 2.161 determinou que, caso os ajustes compensatórios acarretem aumento na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, ou diminuição de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa, não será necessária a ratificação por declaração do representante legal das demais partes da transação controlada.  

Por fim, conforme disposição do art. 51 da IN 2.161, a realização de ajustes espontâneos ou compensatórios não implica na automática realização de ajustes na base de cálculo de outros tributos, inclusive os incidentes na importação.  
Dada a redação adotada, não ficam claros os impactos relativos à valoração aduaneira decorrentes dos ajustes.  

Ajuste primário: efetuado pela autoridade fiscal na hipótese de o contribuinte não efetuar o ajuste espontâneo ou compensatório.  

Os ajustes espontâneo e compensatório devem ser computados para fins de IRPJ e CSLL nos períodos de apuração encerrados em 31 de dezembro, ainda que o regime de apuração seja trimestral.  

Além disso, a IN 2.161 deixa claro que os ajustes não são devidos na apuração das bases de cálculo mensal por estimativa.  

No caso de incorporação, fusão, cisão ou de encerramento de atividades, o ajuste será realizado na data do evento especial. Note que na legislação anterior, havia dúvidas quanto à aplicação dos ajustes de preços de transferência no caso de incorporação, fusão ou cisão, uma vez que não havia expressa previsão legal nesse sentido. 

Para fins do ajuste primário, o fisco poderá utilizar as informações sobre comparáveis disponíveis até a entrega da ECF. 

Serviços de Baixo Valor Agregado (SBVA) 

O artigo 53 da IN 2.161 define como SBVA aqueles serviços que: (i) tenham natureza de suporte; (ii) não sejam parte da atividade principal da parte testada, da parte relacionada ou do grupo multinacional; (iii) não requeiram o uso de bens intangíveis únicos e valiosos e não contribuam para a criação deles; (iv) não impliquem a assunção ou controle de riscos economicamente significativos por parte do fornecedor do serviço e não levem à criação de tal risco significativo para ele; e (v) não contribuam significativamente para a criação, incremento ou manutenção de valor no grupo multinacional. 

São exemplos de SBVA serviços de gestão de recursos humanos, serviços de contabilidade, auditoria, serviços jurídicos, serviços de TI que não sejam parte da atividade principal do grupo, dentre outros.  

A regra de SBVA poderá ser aplicável também para contratos de compartilhamento de custos relacionados às atividades de suporte e que não sejam prestados a partes não relacionadas. 

A IN 2.161 também traz exemplos de atividades que não são consideradas SBVA, tais como atividades de vendas, marketing, atividades de pesquisa e desenvolvimento, transações financeiras, dentre outros.  

No caso de transações controladas que envolvam SBVA, o contribuinte poderá optar por uma abordagem simplificada para fins de aplicação do princípio arm’s length, por meio do qual, a remuneração dos serviços terá uma margem de lucro bruto sobre a totalidade dos custos diretos e indiretos ligados de: 

- ao menos 5%, nas hipóteses em que o prestador seja pessoa jurídica domiciliada no Brasil; 

- no máximo 5%, nas hipóteses em que o prestador seja parte relacionada no exterior 

Caso necessário, um método de atribuição ou critério de rateio adequado deve ser utilizado para se determinar o custo dos serviços intragrupo de baixo valor agregado entre os membros do grupo proporcionalmente aos benefícios ou benefícios esperados para cada membro do grupo. 

Documentação e penalidades 

Para fins de demonstrar a conformidade das transações controladas com o princípio arm’s length, os contribuintes deverão apresentar as seguintes informações para a RFB:  

- Declaração País-a-País: com informações relativas à alocação global das receitas e dos ativos e ao imposto sobre a renda pago pelo grupo, juntamente com os indicadores relacionados à atividade econômica global do grupo. 

- Arquivo Global: contendo informações relativas à estrutura e às atividades do grupo e às demais entidades integrantes do grupo multinacional.  

- Arquivo Local: informações relativas às transações controladas e às partes relacionadas envolvidas nas transações controladas. 

Possibilidade de apresentação do Arquivo Global em inglês ou espanhol; nesses casos, a tradução simples para a língua portuguesa será apresentada apenas em caso de requerimento do fisco.  

Para o ano-calendário 2024 e para os contribuintes que fizeram opção por antecipar já para 2023 os efeitos das novas regras de preços de transferência, o prazo de entrega do Arquivo Global e do Arquivo Local será no último dia útil de dezembro dos anos-calendários 2024 (para operações de 2023) e 2025 (para operações de 2024). A entrega deverá ser feita via processo digital, por meio do e-CAC.  

A partir do ano-calendário 2025, o Arquivo Global e o Arquivo Local deverão ser apresentados 3 meses após o prazo de entrega da ECF do ano-calendário correspondente.  

Especificamente com relação ao Arquivo Local, a IN 2.161 prevê diferentes níveis de informações a serem apresentadas ao fisco considerando o valor total das transações controladas:  

  • Caso o valor total das transações controladas do contribuinte, antes dos ajustes de preços de transferência, seja maior ou igual a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais), o contribuinte deverá apresentar o Arquivo Local com um maior detalhamento de informações, conforme artigo 59 e artigo 60 da IN 2.161.  
  • Caso o valor total das transações controladas do contribuinte, antes dos ajustes de preços de transferência, seja maior ou igual a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) e menor que R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais), o nível de detalhamento será mais simples e deverá conter as informações apresentadas no artigo 61 da IN 2.161.  

O contribuinte está dispensado da entrega do Arquivo Local e do Arquivo Global na hipótese de transações controladas, antes dos ajustes de preços de transferência, inferiores a BRL 15.000.000,00 (quinze milhões de reais).  

Aplicação de multas conforme Lei 14.596 (valor mínimo de R$ 20 mil e máximo R$ 5 milhões) na hipótese de não apresentação da documentação tempestivamente. 

Não aplicação da multa de ofício 

Caso o fisco discorde, durante o procedimento fiscal, do ajuste efetuado na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, conforme artigo 67 da IN 2.161, o contribuinte poderá ter um prazo de 30 dias para retificar a ECF e a DCTF (exclusivamente em relação aos ajustes de preços de transferência), para a sua regularização. 

A possibilidade de retificação somente será aplicada nos casos em que o contribuinte (i) não tenha agido contrariamente a ato normativo ou interpretativo vinculante da administração tributária; (ii) tenha cooperado com a RFB, inclusive durante o procedimento fiscal; (iii) empreendido esforços razoáveis para cumprir o disposto nesta Instrução Normativa; e (iv) adotado critérios para a determinação da base de cálculo coerentes e razoavelmente justificáveis. 

Desde que o crédito tributário correspondente seja pago integralmente, com a incidência de acréscimos moratórios e até o prazo assinalado para a retificação, não haverá a aplicação da multa de ofício. 

Continuaremos acompanhando as alterações nas regras de preço de transferência e nos colocamos à disposição para a solução de dúvidas que eventualmente possam surgir. 

Authors

Juliana Porchat de Assis
Juliana Porchat de Assis
Tax
São Paulo
Eric Hissashi Nagamine
Eric Nagamine
Tax
São Paulo
Haroldo Domingos Bertoni Filho
Haroldo Domingos Bertoni Filho
Tax
São Paulo

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