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No dia 08 de novembro de 2023, foi aprovada no plenário do Senado a Proposta de Emenda Constitucional nº. 45 (PEC 45). O texto aprovado manteve a maior parte dos pontos apresentados no final de outubro pelo relator da proposta, Senador Eduardo Braga. No entanto, as mudanças introduzidas pelo Senado ao texto precisam ser reanalisadas e aprovadas pela Câmara dos Deputados.
O objetivo principal da PEC 45 é a simplificação do sistema tributário atual, de modo a garantir a não cumulatividade plena, diminuir os índices de litigância e custos de conformidade. A proposta também visa alinhar o sistema tributário a objetivos mais amplos, como os de justiça e preservação ambiental.
De modo resumido, no que se refere aos tributos incidentes sobre o consumo, a PEC 45 propõe a substituição de 5 tributos: ICMS, PIS, COFINS e ISS, pelo chamado “IVA Dual”, representado pela (Contribuição sobre Bens e Serviços (“CBS”) e Imposto sobre bens e Serviços (“IBS”). Além disso, prevê também a criação do Imposto Seletivo (“IS”) em substituição ao IPI.
Há outras mudanças introduzidas pela reforma que afetam os impostos incidentes sobre a propriedade de bens, bens e também sobre a transmissão de bens e direitos sobre doações e heranças.
A seguir, resumimos os principais aspectos da reforma tributária considerando as alterações aprovadas no Senado.
IBS e CBS
- O IBS e o CBS serão aplicáveis a todas as transações que envolvam a aquisição de bens e serviços tangíveis e intangíveis, incluindo importações.
- O IBS e o CBS seguirão as mesmas regras quanto à definição de fatos geradores, sujeito passivo, imunidades, base de cálculo, alíquotas e regras de registro de créditos.
- A reforma implementará um sistema de tributação não cumulativa. Assim, será concedido crédito fiscal sobre todas as compras de bens e serviços associadas ao efetivo pagamento dos tributos.
- A lei garante a possibilidade de ressarcimento em caso de acúmulo de créditos. Exceção para bens e serviços para uso pessoal e operações sujeitas a isenção ou não tributação.
- Impostos devidos com base no local de consumo, com base no princípio do destino. Critérios ainda a serem definidos pelas leis.
- Considerando que os impostos sobre o consumo são, em última análise, devidos pelo consumidor final, a reforma introduziu um mecanismo de cashback disponível para pessoas qualificadas de acordo com os requisitos que considerarão os níveis de renda e outros elementos. Esse sistema serve como instrumento para a implementação de um sistema tributário mais progressivo.
- Foi aprovada a possibilidade de cashback no caso de produtos da cesta básica ampliada, consumo de energia elétrica e gás liquefeito de petróleo por consumidor de baixa renda.
- Os dois impostos serão instituídos por lei complementar. A alíquota da CBS poderá ser fixada em lei ordinária. A alíquota do IBS será determinada por estados e municípios. Estima-se que a alíquota final combinada, considerando os dois tributos, esteja ao redor de 27,5%.
- As alíquotas de IBS e CBS terão um limite baseado na média de arrecadação dos tributos que serão extintos (ICMS, ISS, PIS e COFINS) em relação ao PIB entre 2012 e 2021. Na hipótese de exceder esse teto, a alíquota de referência deverá ser reduzida. O mecanismo tem o objetivo de evitar a majoração de tributos com a reforma tributária.
- A lei complementar deverá definir os alimentos da Cesta Básica Nacional de Alimentos, que estarão sujeitos à alíquota zero de CBS e IBS, considerando as distinções regionais existentes no país.
- Foi prevista também a criação de uma Cesta Básica estendida com incidência de IBS e CBS com alíquota reduzida. A lei complementar deverá disciplinar a Cesta Básica estendida.
Regimes diferenciados
A reforma tributária previu a redução das alíquotas da CBS e do IBS para determinados produtos, serviços ou setores. A tabela abaixo resume os regimes diferenciados aplicáveis de acordo com as alterações promovidas pelo novo texto da PEC 45 (os regimes diferenciados deverão ser objeto de lei complementar):
Autorização para redução de 30% | Redução de 60% | Autorização de redução de 60% para 100% ou isenção |
Prestação de serviços de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, desde que sejam submetidas a fiscalização por conselho profissional. | Serviços de educação e saúde. | Cesta Básica Nacional de Alimentos (a ser definida). |
Alimentos destinados ao consumo humano. | Produtos hortícolas, frutas e ovos. | |
Insumos agropecuários e aquícolas. | Serviços de saúde, dispositivos médicos, medicamentos, dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência, medicamentos, produtos de cuidados básicos à saúde menstrual. | |
Produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura | Compra de medicamentos e dispositivos médicos pela administração direta, autarquias e fundações públicas da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, bem como pelas entidades de assistência social. | |
Produtos de limpeza os produtos de higiene pessoal (apenas para produtos majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda). | Automóveis para pessoas com deficiência e com transtorno do espectro autista ou motoristas profissionais que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi) | |
Produções artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas, literárias e audiovisuais nacionais, atividades desportivas, serviços de comunicação institucional | Serviços prestados pelas entidades de inovação, ciência e tecnologia (ICT), sem fins lucrativos. | |
Bens e serviços relacionados a soberania e segurança nacional, segurança da informação e segurança cibernética; e bens e serviços que promovam a economia circular e a sustentabilidade no uso de recursos naturais. | Atividades de assistência e reabilitação urbana de zonas históricas e áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística. | |
Serviços de transporte coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano | Serviços de educação – PROUNI (CBS apenas) | |
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Indústria automotiva
Para a indústria automotiva, foi previsto o retorno dos benefícios fiscais, na forma de crédito presumido da CBS, para projetos em plantas fabris já existentes ou que aproveitem plantas já existentes, limitados a veículos elétricos ou híbridos com motor a combustão, desde que utilizem álcool combustível.
Os créditos presumidos de CBS somente poderão ser compensados com débitos de tributos devidos à Receita Federal do Brasil, não sendo possível a transferência de créditos para outros estabelecimentos da pessoa jurídica. Os créditos presumidos de CBS poderão ser mantidos até o 31 de dezembro de 2032.
Prorrogação até 31 de dezembro de 2032 de incentivos tributários concedidos a montadoras instaladas no Norte, no Nordeste e no Centro-Oeste. Porém, o benefício se aplicaria apenas para projetos aprovados até 31 de dezembro de 2024. Houve alteração, uma vez que a versão inicial do relatório previa benefício apenas para produção de carros elétricos.
O incentivo se estende a montadoras de veículos movidos a biodiesel e a veículos híbridos movidos a biodiesel e a gasolina.
Outras desonerações
Adicionalmente, o relatório trouxe a possibilidade de desoneração da aquisição de bens de capital por meio de crédito integral e imediato do imposto; diferimento; ou redução em 100% das alíquotas do imposto. A lei complementar definirá a forma de desoneração.
Foi autorizada a possibilidade de desoneração do imposto aplicáveis aos regimes aduaneiros especiais e às zonas de processamento de exportação.
Por fim, foi prevista a isenção de IBS e CBS para produtores rurais (pessoa física ou jurídica), desde que não ultrapassem o limite de receita anual de BRL 3,6 milhões.
Os benefícios poderão ser reavaliados a cada 5 anos, considerando o custo-benefício aplicável.
Regimes específicos
Lei complementar poderá prever regimes de tributação específicos para determinados setores e produtos. Tal previsão não significa necessariamente que haverá redução na carga tributária. Os setores e atividades incluídos são:
- Combustíveis e lubrificantes.
- Serviços financeiros, operações com bens imóveis, planos de assistência à saúde e concursos de prognósticos.
- Sociedades cooperativas.
- Inclusão das agências de viagens e turismo no regime específico de serviços de hotelaria, parques de diversão e parques temáticos, bares e restaurantes e aviação regional. Além disso, foi incluída a possibilidade de a lei complementar fixar uma base de cálculo distinta da regra geral no caso de agências de viagens e turismo, bem como regime específico para atividade esportiva desenvolvida por Sociedade Anônima de Futebol (SAF).
- Criação de regime específico para serviços de saneamento e de concessão de rodovias, com permissão de desoneração de IBS e CBS na aquisição de bens de capital e alteração nas alíquotas e nas regras de reconhecimento de créditos.
- Criação de regime específico para operações que envolvam a disponibilização da estrutura compartilhada dos serviços de telecomunicações, com permissão de alteração nas alíquotas e nas regras de reconhecimento de créditos.
- Inclusão de operações alcançadas por tratado ou convenção internacional, inclusive referentes a missões diplomáticas, repartições consulares e representações de organismos internacionais: inserção no regime específico.
- Inclusão de setores de transporte coletivo de passageiros rodoviário intermunicipal e interestadual, ferroviário, hidroviário e aéreo nos regimes específicos.
- Aviação regional.
- Operações com microgeração e minigeração de energia distribuída de energia elétrica.
- Bens e serviços que promovam a circularidade da economia e a sustentabilidade no uso de recursos naturais.
- Lei complementar poderá definir o sujeito passivo do imposto sobre operações ocorridas em plataformas digitais a pessoa que concorrer para a realização, a execução ou o pagamento da operação, ainda que residente ou domiciliada no exterior.
Imposto Seletivo (IS)
Fato gerador
- Incidirá sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente. O texto inova ao trazer a atividade de extração para o campo de incidência do IS.
- O novo texto expressamente determina que o IS deverá ser regulado por lei complementar.
- Na redação aprovada pela Câmara dos Deputados, havia abertura para a incidência de IS sobre energia elétrica e serviços de telecomunicação. O novo texto afasta a incidência sobre energia elétrica e serviços de telecomunicações.
- Além disso, o texto prevê expressamente a incidência de IS sobre armas e munições, exceto quando destinadas à administração pública. Também foi mantida a possibilidade de incidência sobe combustíveis.
Base de cálculo
- Não integrará a própria base (“cálculo por fora”).
Alíquota
- As alíquotas poderão ser alteradas por meio de lei ordinária, permitindo a edição de medida provisória neste ponto. Foi vedada a alteração de alíquotas por meio de decretos.
- A medida provisória que altere o IS deverá produzir efeitos somente no exercício financeiro seguinte, condicionada à conversão em lei até o último dia do exercício em que foi editada.
- O IS deverá respeitar a anterioridade anual.
- No caso da atividade de extração, foi instituída a possibilidade de estabelecimento de alíquotas ad rem, que incidam sobre a quantidade do produto extraído, independente das receitas de venda. Nesse caso, a alíquota máxima será de 1% do valor de mercador dos produtos extraídos.
Não cumulatividade
- Expressamente estabelecido que a incidência do IS será monofásica, ou seja, incidirá uma única vez sobre o bem ou serviço.
Implementação
- IS somente poderá ser cobrado a partir de 2027, com a desoneração do IPI.
Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE)
- Criação de uma CIDE com a possibilidade de cobrança a partir de 2027 que deverá garantir a competitividade dos bens produzidos na Zona Franca em relação aos bens produzidos no restante do país.
Temas Diversos
- Previsão expressa de compensação de saldos credores de PIS, COFINS e IPI com outros tributos federais ou ressarcimento em dinheiro.
- Excluiu a criação de uma nova contribuição vinculada a investimento em obras de infraestrutura e habitação.
- Manutenção das contribuições a todos os fundos estaduais em funcionamento em 30 de abril de 2023 que tenham sido instituídas como contrapartida pelo tratamento favorecido relativo ao ICMS, devendo ser observadas as regras e os limites de recolhimento previstos na legislação estadual até referida data.
- Mantém os desembolsos previstos até 2033, quando a União deverá transferir até R$ 40 bilhões para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR). A partir daí, haverá um incremento de R$ 2 bilhões ao ano, até se atingir o montante de R$ 60 bilhões em 2043.
- Aplica-se aos titulares de benefícios onerosos de ICMS regularmente concedidos até 31 de maio de 2023, incluindo prorrogações ou renovações posteriores, assim como a titulares de projetos abrangidos pelos benefícios a que se refere o artigo que trata do setor automotivo.
- O novo texto prevê que o ITCMD será progressivo em razão do valor efetivamente recebido do quinhão, do legado ou da doação, a fim de condicionar a progressividade da alíquota ao valor transmitido ao recebedor e não ao valor total dos bens na transmissão (como era previsto na redação anterior).
- Além disso, o texto aprovado pelo Senado autoriza a cobrança de ITCMD sobre heranças e doações de residentes no exterior sem a necessidade de lei complementar.
- IPVA: previsão da incidência do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) em embarcações e aeronaves, com possibilidade de IPVA progressivo em razão do impacto ambiental do veículo.
- IPTU: Autorização para que o Executivo Municipal atualize a base de cálculo do imposto por meio de decreto, com base em critérios gerais estabelecidos em lei municipal.
Continuaremos acompanhando a evolução legislativa da PEC 45 e nos colocamos à disposição para a solução de dúvidas que eventualmente possam surgir.