Publicação 06 jan. 2025 · Brasil

Boleto 2.0: conheça as novas regras, como a integração com o pix, o boleto dinâmico e a nova estrutura de governança

Novo arcabouço normativo para arranjo de pagamento de boleto divulgado pelo Banco Central do Brasil

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Entre as diversas normas editadas no mês de dezembro, como já é tradicional, o Banco Central do Brasil (“BCB”), por meio da Resolução BCB nº 443/2024, divulgou o novo arcabouço normativo do arranjo de pagamento de boleto, que entrará em vigor em 03 de fevereiro de 2025 e possui o objetivo de aperfeiçoar e modernizar as regras que disciplinam esse instrumento de pagamento.

Atualmente, está entre os cinco meios de pagamento mais utilizados no país, atrás apenas do Pix e dos cartões de crédito, débito e pré-pagos[1]. Isso demonstra que, apesar do surgimento de novas tecnologias de pagamento nos últimos anos, o boleto continua sendo amplamente utilizado pela população, o que reforça sua relevância no sistema de pagamentos do país.

Nesse contexto, compreende-se a necessidade de o regulador estabelecer regras mais modernas e adaptadas às demandas atuais, com vistas a melhorar cada vez mais a experiência de usuário e ampliar a versatilidade desse meio de pagamento.

A seguir, destacamos os principais pontos trazidos pelo BCB nesta nova regulamentação:

 

Pagamento de boleto por Pix

Uma das principais inovações introduzidas pela nova regulação é a possibilidade de pagamento do boleto por meio de outro arranjo de pagamento autorizado ou operado pelo BCB, como o Pix. Assim, além do tradicional código de barras, o boleto poderá conter um código QR Code específico para facilitar o pagamento via Pix.

Com essa medida, o BCB busca integrar a agilidade, conveniência e ampla aceitação do Pix à experiência de uso do boleto. Vale ressaltar que o boleto já passou por modernizações recentes, como a possibilidade de liquidação interbancária no mesmo dia do pagamento (D+0). Com essa inovação, boletos pagos até às 13h30 permitem o recebimento dos recursos pelo beneficiário no mesmo dia, a depender do contrato firmado com sua instituição[2]. Agora, com o Pix, os recursos poderão ser recebidos de forma instantânea, ampliando ainda mais a eficiência deste instrumento de pagamento.

Algumas instituições já ofertam a possibilidade de pagamento de boletos com uso de Pix de forma experimental, conforme reconhecido pelo próprio BCB. Contudo, nos próximos meses, com a entrada em vigor da nova regulamentação, a expectativa é que essa inovação seja disponibilizada de forma ampla pelas instituições.

É importante destacar a necessidade de integração entre o sistema por onde os boletos usualmente são registrados e liquidados (Sistema de Liquidação Diferida das Transferências Interbancárias de Ordens de Crédito – SILOC, operado pela Nuclea, antiga CIP) e o sistema de liquidação do Pix (Sistema de Pagamentos Instantâneos - SPI), para garantir que, na medida em que o pagamento ocorra via Pix, o boleto conste como pago na base centralizada da cobrança da Nuclea, evitando, assim, que a cobrança continue em aberto e haja o risco do pagamento do boleto em duplicidade pelo usuário.

 

Criação do boleto de cobrança dinâmico

A regulamentação também introduziu o boleto de cobrança dinâmico, que se soma às modalidades existentes (boleto de cobrança comum, boleto de proposta e boleto de depósito e aporte).

Esta nova modalidade caracteriza-se por: (i) ser vinculado a um ativo financeiro objeto de escrituração, registro ou depósito centralizado em sistemas autorizados pelo BCB; e (ii) permitir a alteração da instituição destinatária e do beneficiário, que passaria a ser o titular dos direitos relativos ao ativo financeiro vinculado, em caso de negociação, de forma a refletir a própria dinâmica da circulação de ativos.

Dessa forma, a alteração da instituição destinatária e do beneficiário será realizada diretamente nesses sistemas.

Além disso, para evitar o risco de desvio de garantias vinculadas a ativos financeiros circuláveis e garantir a possibilidade de seu controle ou rastreamento, a emissão do boleto de cobrança dinâmico será a única modalidade de boleto permitida para o caso de beneficiários que tenham relação contratual com escrituradores, entidades registradoras ou depositários centrais para fins de escrituração, registro ou depósito de ativos financeiros que representem dívidas em cobrança das quais sejam credores originais os próprios beneficiários.

Na prática, quando um ativo financeiro (como uma duplicata escritural) for negociado com terceiros pelo credor original, será possível alterar o beneficiário e a instituição destinatária do boleto de pagamento atrelado a esse ativo. Isso traz segurança ao devedor, que efetuará o pagamento ao legítimo credor, e ao novo beneficiário, que não precisará emitir novos boletos para garantir o recebimento dos recursos.

É importante avaliar como essa mudança impactará a experiência do usuário no momento do pagamento do boleto, especialmente diante do aumento dos casos de fraudes de boletos no país. Caso o usuário identifique, no momento do pagamento, a presença de um beneficiário diferente do original sem que ele tenha sido previamente informado sobre a alteração, existe o risco de que se recuse a realizar o pagamento por receio de se tratar de uma fraude.

Contudo, entendemos que esta inovação é bastante útil tanto para os pagadores quanto para os beneficiários dos boletos e, além disso, trará inúmeras externalidades positivas para o mercado de crédito brasileiro. Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), por exemplo, cuja atividade é, majoritariamente, a gestão eficiente de uma carteira de recebíveis, serão positivamente afetados pela mudança. As securitizadoras também.

Espera-se que os boletos dinâmicos reduzam erros manuais e aumentem a agilidade nos processos operacionais de cessão. Adicionalmente, essa tecnologia promove maior segurança, já que os dados devem ser atualizados de forma integrada e síncrona com os constantes nos sistemas de controle de ativos financeiros, dificultando fraudes. Outra vantagem significativa é a melhoria na experiência dos cedentes e sacados, que passam a contar com informações mais claras e atualizadas, facilitando os pagamentos e contribuindo para a redução da inadimplência, um fator essencial para a saúde financeira e a performance dos FIDCs e de outras operações de securitização.

Nos termos da norma, os tipos de ativos financeiros que poderão ser vinculados a boletos dinâmicos serão divulgados por meio de instrução normativa pelo BCB, de modo a fornecer flexibilidade normativa à dinâmica conjuntural própria do mercado financeiro.

Assim, há que se aguardar a edição de tal ato normativo pelo regulador, o que deve levar alguns meses, tendo em vista que os sistemas de escrituração ou registro responsáveis por fornecer suporte digital aos ativos vinculados ao boleto ainda estão em fase de implementação.

 

Estrutura de governança da convenção de boletos de pagamento

Para fortalecer a governança da convenção entre as instituições participantes do arranjo de boletos, o BCB determinou a criação de uma estrutura específica para a gestão da convenção do arranjo, cujas signatárias hoje são a Associação Brasileira de Bancos (ABBC), a Associação Brasileira de Bancos Internacionais (ABBI), a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (ABECS) e a Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN).

De acordo com o novo arcabouço jurídico do arranjo, tal estrutura deve ser constituída de forma a (i) garantir a plena representatividade e pluralidade das instituições participantes, assegurando a livre escolha de associações representativas; (ii) promover acesso e tratamento não discriminatório às entidades participantes e aos serviços e infraestruturas necessárias ao funcionamento do arranjo; (iii) mitigar conflitos de interesses entre os participantes; e (iv) adotar um modelo tarifário e de reembolso de custos baseado em isonomia, transparência e fundamentação econômica.

Essas medidas visam aprimorar a governança do arranjo de boletos, promovendo maior envolvimento de instituições com perfis diferentes, aumentando a representatividade de suas signatárias e capturando de forma mais efetiva os interesses diversos das instituições integrantes do mercado de pagamentos.

Para mais esclarecimentos sobre esta norma e seus impactos, procure a equipe de Banking & Finance do FAS Advogados in cooperation with CMS.