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Consulta Pública: instruções normativas sobre preços de transferência

Está aberto o prazo para a Consulta Pública da Receita Federal, que visa avaliar as minutas das Instruções Normativas que regulamentarão as transações com serviços intragrupo e o processo de consulta específico em matéria de preços de transferência, conhecido como Acordo de Precificação Antecipada Unilateral (“APA”).

18/09/2024

As novas regras de preços de transferência, introduzidas pela Lei 14.596/23, têm o objetivo de alinhar as normas brasileiras aos padrões internacionais, tornando obrigatória a observância do princípio arm's length em nosso sistema jurídico.

As minutas foram disponibilizadas para aprimorar, por meio do debate público, os atos normativos da Receita Federal.

A seguir, destacamos os pontos de maior interesse das propostas abertas à consulta.

Serviços Intragrupo

De forma geral, serviços intragrupo são aqueles prestados por uma empresa a outra dentro do mesmo grupo econômico. As regras de preços de transferência devem ser observadas nessas transações para assegurar que ocorram em condições de mercado.

Especificamente, a proposta da Receita Federal (“RFB”) define serviços intragrupo como qualquer atividade desenvolvida por uma entidade prestadora, incluindo o uso ou a disponibilização de ativos tangíveis ou intangíveis, que gere benefícios para uma ou mais partes envolvidas. Esses benefícios devem ser claros e economicamente identificáveis, proporcionando uma expectativa razoável de valor econômico ou comercial para a parte que recebe o serviço, contribuindo para melhorar ou manter sua posição no mercado.

A proposta sugere que tais serviços observem o princípio arm's length, oferecendo dois métodos principais para calcular o valor dos serviços:

  1. Método de Cobrança Direta (baseado nos custos diretos); e
     
  2. Método de Cobrança Indireta (pautado na alocação de custos de forma proporcional entre as partes envolvidas por meio de critérios que reflitam a natureza do serviço e os benefícios recebidos).

No caso em que o prestador de serviços atua como intermediário de contratos, a proposta não admite a cobrança de margem de lucro sobre valores repassados a terceiros, exceto se a empresa intermediária desempenhar funções significativas.

Por fim, a proposta da RFB estabelece a obrigação de manutenção de documentação detalhada que comprove os custos e benefícios associados aos serviços prestados e os critérios utilizados para a alocação dos custos, especialmente no caso de adoção do método indireto de valoração.

Acordo de Precificação Antecipada Unilateral (APA)

O Acordo de Precificação Antecipada Unilateral, conforme estipulado no art. 38 da Lei 14.596/23, é um mecanismo que define a metodologia a ser utilizada para determinar os preços de transferência aplicáveis antes da realização das transações controladas.

O APA é celebrado no âmbito do Processo de Consulta Específico em Matéria de Preços de Transferência e visa promover previsibilidade e segurança jurídica para as empresas em operações futuras, abrangendo a seleção de métodos, transações comparáveis e premissas críticas (condições econômicas e operacionais que, se alteradas significativamente, podem modificar o acordo) e ajustes a serem realizados.

A proposta da RFB reforça o caráter voluntário e cooperativo do APA, condicionando sua proposição aos contribuintes que participem do programa de conformidade cooperativa fiscal por pelo menos seis meses. 

O APA pode abranger todas as transações com partes relacionadas ou apenas algumas delas. Sua validade é de quatro anos, podendo ser prorrogada por mais dois, dependendo da concordância das autoridades fiscais. Como regra, o APA não será aplicado retroativamente, exceto mediante autorização expressa da Receita Federal.

A proposta de regulamentação detalha quatro fases distintas do APA:

  1. Fase Preliminar:  Iniciada com o Pedido de Avaliação Preliminar, que deve ser submetido por meio do e-CAC (Centro Virtual de Atendimento). A RFB avaliará a viabilidade do APA com base em informações como a estrutura organizacional do grupo, modelo de negócios, transações controladas a serem incluídas, períodos de apuração e método de preços de transferência a ser utilizado. Documentos adicionais poderão ser solicitados. Se o Pedido de Avaliação Preliminar for aceito, o contribuinte deve pagar, em até 15 dias úteis, uma taxa de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) para a continuidade do processo;
     
  2. Fase de Análise: Após o pagamento da taxa, a Receita Federal poderá solicitar informações complementares, analisar métodos alternativos ou incluir transações adicionais. Nesta etapa, o contribuinte deve apresentar a Proposta de APA, detalhando a aplicação do método proposto. Também pode ser requisitada a tradução dos documentos para o português (se não estiverem em inglês ou espanhol) e a realização de reuniões ou visitas para discutir pontos específicos da proposta;
     
  3. Conclusão do APA: A RFB apresentará uma decisão aceitando ou rejeitando a Proposta de APA, podendo sugerir um acordo alternativo. Se aceita, o texto final do APA incluirá os termos do acordo, transações abrangidas, períodos de apuração e métodos acordados. O contribuinte deverá comunicar qualquer alteração significativa nos fatos ou premissas do acordo;
     
  4. Administração do APA: O beneficiário do APA deve elaborar um relatório anual sobre a aplicação do acordo, evidenciando a conformidade com os termos negociados. O APA pode ser revisado em caso de alterações nas premissas críticas ou na legislação, ou até mesmo revogado em caso de descumprimento das condições acordadas. É possível solicitar prorrogação, mediante o pagamento de uma taxa de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). 

Comentários Finais

Além das sugestões propostas na consulta pública, os participantes podem fornecer comentários e sugestões sobre os dispositivos contidos na Instrução Normativa RFB nº 2.161/23. Também é possível relatar dificuldades ou dúvidas na aplicação da norma e sugerir pontos que necessitam de esclarecimento por meio de exemplos.

Para participar, a parte interessada deve enviar sua submissão em formato PDF para o endereço: [email protected], indicando expressamente se concorda ou não com a publicação do conteúdo de sua submissão e solicitando que sua identificação ou dados pessoais sejam removidos em caso de publicação, se desejar.

O período de consulta se encerrará em 30.09.2024. A regulamentação será editada pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil na forma de Instrução Normativa e terá vigência a partir de 1º de janeiro de 2025.

Seguiremos acompanhando os desdobramentos da consulta pública.

Autora

Juliana Porchat de Assis
Juliana Porchat de Assis
Tributário
São Paulo