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A polêmica em torno da caução no despejo liminar

Desafios na Aplicação da Lei de Locações: Equilibrando Direitos e Deveres de Locadores e Locatários no Contexto do Despejo Liminar.

 

A Lei de Locações (lei n. 8.245/91) regulamenta as locações de imóveis urbanos, criando direitos e obrigações para o locatário e o locador, e cria um sistema de locação que salvaguarda principalmente os locatários – tanto é que, por muitos, a lei é chamada “lei do inquilinato”.

Neste sentido, tem-se que a regra é a realização do despejo (retirada do locatário do imóvel locado) somente após a prolação de sentença (cognição exauriente). Contudo, de forma excepcional e taxativa, a lei autoriza a realização de despejo liminar, conforme prevê o art. 59, §1º da Lei 8.245/91.

No caso, analisaremos especificamente o caso de despejo liminar na hipótese de falta de pagamento e contrato sem garantia.

Com isso, tem-se que no artigo 59, §1º, IX, da Lei de Locações, o legislador condicionou o deferimento da liminar de despejo à prestação de caução, equivalente a três vezes o valor do aluguel vigente. O objetivo da caução seria garantir ao locatário o ressarcimento de eventuais prejuízos que possam ocorrer com a execução antecipada do despejo.

A liminar, em sua essência, serve para os casos em que não é possível esperar até a sentença, sob pena de perecimento do objeto almejado com o processo. Por exemplo, locadores que dependem dos aluguéis para sua subsistência.

Contudo, a previsão da caução gera uma situação problemática, qual seja: o locador que está, em regra, há meses sem receber o aluguel, sem que exista garantia contratual (ou com esta já esvaziada), precisa desembolsar o valor correspondente a 3 aluguéis, sob pena de não ter realizado o despejo liminar.

Ou seja, a obrigatoriedade da prestação de caução impõe ao locador, que já se encontra em prejuízo financeiro por conta da inadimplência, a obrigação de dispor de elevado valor – suficiente para cobrir não apenas as custas processuais e honorários advocatícios, mas também o equivalente a três meses de aluguel.

Essa exigência, muitas vezes, beneficia o inadimplente (locatário) em detrimento daquele que já sofreu grave lesão ao seu patrimônio (locador), chegando, em certos casos, até a impossibilitar o deferimento da liminar, dado que nem sempre o locador não consegue dispor daquele montante para caucionar.

A equação é indelicada e, na maioria das vezes, é prejudicial ao locador, dado que: ou o locador deposita à vista o valor correspondente a 03 (três) aluguéis; ou verá o débito de aluguéis crescer até a sentença, majorando seu prejuízo, que nem sempre poderá ser ressarcido.

Desta forma, considerando que a ideia da caução é de garantir uma espécie de indenização ao locatário, caso o despejo antecipado se mostre equivocado, não poderia a caução corresponder ao valor dos aluguéis em atraso, devidos pelo locatário?

Essa hipótese se mostra mais razoável e proporcional, já que nem sempre a parte hipossuficiente é o locatário, principalmente quando o valor da dívida é superior a três meses de aluguel, sendo certo que eventual “indenização” poderia se dar por mero “acerto de contas” entre o débito e o crédito de locador e locatário, nos termos do instituto da confusão – previsto no art. 381 e 384 do Código Civil.

Tal medida tem sido aplicada por alguns Tribunais, que tem analisado caso a caso, em vez de simplesmente aplicar o disposto no artigo 59, §1º, inciso IX, da Lei de Locações.

Ocorre que, apesar de parte da jurisprudência entender pela dispensa da caução nesses casos, os Tribunais, especialmente o de São Paulo, não concedem a liminar sem o depósito da caução, independentemente de o valor ser superior ao devido pelo locatário.

Assim, a aplicação do disposto no artigo 59, §1º, inciso IX da Lei de Locações, de forma literal, sem a análise do contexto social, econômico e razoável desta previsão, gera uma proteção demasiada ao locatário, em detrimento do (quase) impedimento ao locador de se utilizar do despejo liminar.

Considerando que o locatário tem a oportunidade de purgar a mora ou mesmo comprovar o adimplemento de suas obrigações, temos que o deferimento da liminar de despejo sem a caução se mostra uma solução equilibrada para as partes e não impõe risco de dano irreparável.

Assim, verifica-se que o judiciário brasileiro precisa analisar caso a caso para aplicar o disposto na Lei de locações, considerando que nem sempre a parte hipossuficiente se encontra no polo passivo da ação, e possibilitar, de acordo com essa análise, o despejo sem a prestação da caução.

Autores

Marina Rocha Farias
Marina Rocha Farias
Relações de Consumo
São Paulo
Felipe Vilela Ramalho
Felipe Vilela Ramalho
Resolução de Conflitos
São Paulo
Juliana de Araujo Duarte
Juliana de Araujo Duarte
Relações de Consumo
São Paulo

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